Contos e crônicas
Dez conclusões “machadianas”
JORGE LEITE DE OLIVEIRA
jojorgeleite@gmail.com
De Brasília-DF
Amiga leitora, hoje vou filosofar um pouco,
pois "os tempos são chegados". De acordo com Yuval Noah Harari, em Uma breve história da humanidade, nada
mais somos do que a ramificação dos primatas que, de cerca de doze mil anos
para cá, vem dominando o mundo e exterminando outros animais, muitos dos quais
reproduzidos para nos alimentar.
Diz ele, no final do primeiro capítulo de
sua obra: "Se a culpa é dos sapiens ou não, o fato é que, tão logo eles
chegavam a um novo local, a população nativa era extinta".
Na conclusão desse capítulo, Harari deduz
que, provavelmente, o Homo sapiens, que somos nós, "conquistou
o mundo, acima de tudo, graças à sua linguagem única".
Isso me faz pensar nas teorias de renomados
filósofos do século XIX que, baseados nessa "linguagem única",
realizaram verdadeiras proezas intelectuais para provar que nada mais somos do
que matéria.
A base para tal constatação é a Ciência
Positivista, que foi elevada à condição de verdade absoluta, contra todas as
ideias espiritualistas do passado e do presente. Um dos seus teóricos foi Hegel
(1770- 1831), que "matou a religião" e elegeu a adoração ao homem
como fundamento de nossas vidas, ao considerar a História como a
"realidade absoluta" e "eliminar a dicotomia matéria e
espírito".
O fundador do Positivismo foi Auguste Comte
(1798-1857), que substituiu a Filosofia pela Ciência. Seu culto é o da
Humanidade, o "Grande Ser", composto pelos cidadãos do passado, do
presente e do futuro que foram, são ou possam ser úteis à própria Humanidade.
Outro "humanista absoluto" foi
Nietzsche (1844- 1900), com sua teoria sobre o "super-homem" cujo
objetivo na vida seria o de idolatrar o próprio corpo e buscar, antes de mais
nada, os próprios interesses, uma vez que, para ele, nada mais somos do que
matéria e, como tal, fadados à extinção após a morte. Para Nietzsche, Deus não
existe; e a concepção de uma divindade é um pretexto para dominar as mentes e
os povos fracos. Esse filósofo foi enlouquecendo aos poucos e morreu louco, mas
ainda é seguido por muitos...
Mas quem estrutura, definitivamente o Materialismo,
cuja teoria já existia no mundo desde a época dos filósofos gregos
pré-socráticos (cerca de 500 anos a.C.), foi Karl Marx (1818-1883), com a
contribuição de Engels, que finalizou sua obra máxima após a morte de Marx: O Capital.
Alguns políticos e cidadãos brasileiros
levaram a sério tais devaneios e procuraram aplicá-los com rigor à vida
prática, principalmente, com base na já tão conhecida "lei de
Gérson", que, embora nos proponha levar "vantagem em tudo",
também nos conduz ao suicídio lento pelo tabagismo, pois essa “lei” surgiu de
uma propaganda de cigarros em que o ex-craque de futebol, Gérson, cigarro à
boca, dizia a célebre frase: “Gosto de levar vantagem em tudo, certo?”
Então, amiga, vou enumerar-lhe agora as dez
conclusões que cheguei em relação ao abismo ao qual foi atirado nosso país
pelos maus políticos, empresários e economistas inescrupulosos:
1ª) É preciso conquistar e manter o poder a
todo o custo. Então, nomeemos para os diversos cargos públicos e políticos as
pessoas que trabalhem para a grande coligação partidária formada pelos partidos
da situação.
2ª) No judiciário, indiquemos para
cargos-chave, em especial na direção de presídios, filiados aos nossos
coligados, pois estes saberão tratar humanamente os pobres traficantes e matadores
de ou sem aluguel. Para as cadeias, encaminhemos, também, os incautos que não
pagam pensão, o imposto de renda, etc. e os deixemos junto com aqueles, que
saberão cuidar destes.
3ª) Indiquemos os "melhores
políticos" para a gestão e negócios de grandes empresas e bancos públicos,
eles saberão onde depositar os lucros desviados para nossos "fundos
partidários" e "bolsos sem fundos".
4ª) Criemos o maior número de programas
sociais, pois o povo não gosta de estudar e fundar escolas é desperdício de
dinheiro público. Isso fica para a iniciativa privada.
5ª) Universidades públicas, como a do Rio
de Janeiro são desperdício de dinheiro. Nada de subsídios a essas fontes de
alienação mental. O que o povo quer é circo e brioche.
6ª) Nossas escolas públicas devem ser
instruídas a orientarem seus alunos com base nas seguras teorias materialistas
de Marx e seus companheiros de ideal econômico. "Proletários,
(des)uni-vos, nós sabemos o que é melhor para vocês".
7ª) Vamos criar um cadastro de maus
pagadores e convidá-los a saldar suas contas, anualmente, com descontos de até
80%. Deixemos aos otários o pagamento integral de seus impostos e
endividamentos.
8ª) Governar é fazer dívidas e construir
"elefantes brancos" que fiquem inacabados e sem possibilidade de sua
construção. Que se danem os escrúpulos. Afinal, o nosso é apenas um dentre
milhares de municípios, e ninguém vai nos fiscalizar pois já tomamos nossas
providências para corromper os fiscais que têm o DNA semelhante ao nosso. (Não,
amigo leitor, não se trata de Data de
Nascimento Antigo, mas você pode sugerir outro significado. Que tal Depravado Nível Animal?)
9ª) Vamos manter as indicações políticas
para os altos cargos governamentais, em especial nos tribunais de justiça. Se
nossos representantes estiverem no comando das leis, estas nunca serão contra
nós. E se forem, nossos companheiros dos diversos sindicatos políticos e
movimentos paramilitares não permitirão que nos façam qualquer mal.
10ª) E última conclusão: Mantenhamos a
obrigatoriedade do voto e a urna eletrônica. Do resto, cuidamos nós. Afinal, só
nós, os animais fortes e poderosos, sobreviveremos.
Após nós, que venha o dilúvio.
Qualquer semelhança de muitos políticos
atuais com o Homo sapiens é isso mesmo: completa.
E eu, amigo leitor, não falo mais de
política.
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