domingo, 23 de novembro de 2014

"A FELICIDADE É O NOSSO DESTINO, MAS NÃO É UMA DÁDIVA GRATUITA"

Entrevista Espanhol Inglês
Ano 8 - N° 390 - 23 de Novembro de 2014
ORSON PETER CARRARA
orsonpeter92@gmail.com
Matão, SP (Brasil)

 
Edson de Jesus Sardano: 
“A felicidade é o nosso destino, mas não é uma dádiva gratuita”
Vereador na cidade paulista de Santo André, o confrade analisa o tema Política e Espiritismo e a conjuntura política em que vivemos

Edson de Jesus Sardano (foto), natural de Santo André (SP), onde também reside, é coronel da reserva da Polícia Militar. Bacharel em Direito, elegeu-se vereador na cidade em 2012. Ligado ao Centro Espírita Dr. Bezerra de Menezes e à Creche Amélia Rodrigues, da qual é segundo secretário, Edson é expositor espírita e realiza também pales-
tras sobre segurança e temas da atualidade. 

Como encarar o momento político do país?
Por um lado me preocupa o acirramento dos ânimos, muitas ofensas e uma busca por culpados no outro lado do espectro ideológico, mas, por outro lado, entendo que se trata de uma acomodação natural. Esse sentimento que está sendo manifestado agora, a pretexto da política, estava na alma das pessoas. As eleições apenas permitiram que ele se manifestasse. Não creio que as coisas estejam piorando. 
O que se pode esperar para os próximos anos nesta luta de construção da democracia?
Creio que aos poucos, depois de tantas trocas de acusações, ambos os lados vão perceber que tinham uma parcela de razão, de modo que há que se reformar o modelo como um todo, a partir do eleitor, que, antes de vítima, é o principal autor desse processo. Passada a euforia da vitória/derrota, vai-se buscar, entre os escombros, uma sociedade melhor. Todos desejam isso. 
Como o país vai vencer os desafios contra a corrupção?
Esse é um processo muito lento, que precisa partir de cada cidadão. O brasileiro não gosta de cumprir leis. Vemos isso nas filas de shows e nos jogos de futebol, onde quem pode pagar mais passa na frente; na tentativa de resolver problemas variados com um "jeitinho", como multas de trânsito etc. Temos uma tendência de reduzir e até justificar nossas faltas, apontando apenas as alheias. Políticos conhecidos como corruptos, mas gestores eficientes, são festejados pelos eleitores. Funcionários públicos corruptos, porém importantes sob o ponto de vista político, são recebidos nas altas rodas sem nenhum constrangimento. O brasileiro não manifesta nenhuma indignação em relação a isso. Até gosta de estar próximo, pois um dia pode precisar... O cidadão honesto é visto como um ingênuo, romântico. Se alguém acha uma mala com dinheiro e devolve, vai para o Jornal Nacional, porque é algo inusitado. Todos temos uma parcela de culpa. Logo, uma parcela da solução. Basta fazermos a nossa parte. 
E os desafios da violência urbana e do combate à disseminação das drogas e seus desdobramentos?
Precisamos combater a criminalidade, mas sem colocar todo o peso nos ombros do criminoso. Ele é apenas uma parte do processo e para a sua conduta existe uma lei. Precisamos repelir qualquer ideia de vingança social e mesmo o recrudescimento das leis penais, que, na prática, é uma vingança disfarçada. Além do mais, como cristãos, não pode pairar dúvidas em nossas mentes de que haveria qualquer tipo de impunidade. Pode-se enganar a justiça dos homens, mas não as leis da vida, que atribuem a cada um as consequências de suas próprias obras. O combate às drogas é um grande desafio, principalmente porque as chamadas drogas legais são toleradas e até incentivadas nas famílias, em especial o álcool, e são, sem dúvida, a porta de entrada das demais. Um amplo processo de prevenção e educação também é imprescindível, principalmente pelo exemplo em família. O papel da formação familiar e religiosa aí é fundamental. A repressão policial deve ser voltada de forma mais acentuada ao traficante, mas o consumidor não pode ter o tratamento romântico que muitas vezes se lhe dá, minimizando tal conduta. 
A divisão do país, em números quase exatos, na diversidade da escolha do Presidente nas eleições, traz que indicativo à luz da Política?
Que o atual modelo está caminhando para o esgotamento. As inovações de caráter social, todas muito oportunas e benéficas, acabaram cedendo lugar ao apego ao poder e episódios não mais isolados de corrupção. As ideias do PT são muito boas e até compatíveis com os ideais cristãos, todavia as pessoas encarregadas de implementá-las deixaram-se levar pelos apelos da matéria e por um apego excessivo ao poder; à arrogância de acreditarem-se os únicos capazes de algo bom para o país, enfim, comprometeram os ideais em função da falta de bases morais para sustentar o projeto político. Creio que não seria diferente com qualquer outro partido com tanto poder. As coisas com o PT assumem um caráter mais alarmante porque, primeiramente, esperava-se deles uma conduta diferente; mas como esperar algo de diferente de pessoas iguais? Iguais como um todo, inclusive a nós. Segundo, porque é um partido muito grande e centralizado, de modo que tudo nele se acentua. Desde a virtude, até os equívocos. O poder é um grande desafio. Mistura dinheiro, status, sexo e outros apelos com forte poder de persuasão. Há que estar muito bem preparado para resistir. A maioria tem sucumbido, infelizmente. 
E à luz do Espiritismo?
À luz do Espiritismo cabe-nos fazer a nossa parte. Colaborar e participar como cidadãos e não julgar. Orar pelos detentores de poder, porque eles só despertam inveja em quem não tem o verdadeiro alcance dos valores da vida. Não podemos ser coniventes com o erro, mas devemos ser misericordiosos com os que erram, agradecendo a Deus não termos sido expostos a esses desafios, pois pode ser que não resistiríamos também. Podemos e devemos participar da política, deixando sempre claro que jamais como movimento espírita. O cidadão espírita deve escolher bem seus representantes e, na medida do possível, até apoiar aqueles que entenda sejam merecedores de sua confiança, mas volto a acentuar: nunca utilizando a Causa Espírita, nem mesmo a Casa Espírita. Devemos lutar para vivenciarmos o evangelho. O cumprimento às leis e regras de cidadania estará consequentemente incluído. Temos que ser exemplo. Não podemos esquecer que "Deus está no comando". Não estamos vivenciando nada que não esteja nos planos divinos para o nosso progresso. Não cabe pessimismo na postura do espírita. Estamos caminhando inexoravelmente para o progresso. 
O que o Espiritismo tem a dizer sobre o momento de dificuldades do país?
O momento que vivemos é a soma da conduta de cada um de nós. Vivemos no mundo que merecemos viver, porque participamos de sua construção, seja pelas nossas ações equivocadas, seja pela nossa omissão covarde. O aparente desarranjo climático, a violência urbana, a falta de estabilidade econômica, entre outros problemas, são consequências do nosso imediatismo e egoísmo. Não é um castigo, mas restrições resultantes da imaturidade das pessoas. Só a partir do surgimento dos problemas é que começamos a pensar em sustentabilidade, distribuição de renda, planejamento etc. Por muitos anos a postura extrativista imperou na formação do nosso País. Extraímos tudo o que era possível. Agora chegou a hora de devolver. Às vezes dói um pouco, mas é um processo pedagógico paternal e necessário. 
Por que o quadro atual quase se situa num retrocesso à liberdade, em face das supostas lesões à Lei de Liberdade exposta em O Livro dos Espíritos?
A liberdade, como todas as leis que regem o universo, tem uma finalidade que precisa ser respeitada. As transgressões e os abusos levam, naturalmente, a sequelas danosas, com aparência de restrição, mas sempre sob o signo da Justiça e da finalidade educativa. Somos livres para jogar pedras ao alto, mas devemos estar com as cabeças preparadas para quando elas caírem de volta. 
Algo marcante de sua experiência profissional e de atuação política, à luz do Espiritismo, que gostaria de relatar aos leitores?
Trabalhei 30 anos na Polícia Militar e estou há dois como vereador. São atividades que muitas pessoas entendem como ruins por si sós. Eu posso dizer que foram as melhores oportunidades que a vida me proporcionou para o meu aprendizado. Posso dizer que não há atividade (legal) ruim. Tudo depende de como nos comportamos. Na PM pude ajudar muita gente, salvar algumas, mas, principalmente, pude dividir com meus subordinados e colegas os ensinamentos do evangelho na prática cotidiana, acentuando principalmente o respeito às leis, à dignidade humana, a não violência, tudo preconizado nas normas vigentes do país, mas que uma pessoa sem uma sólida formação moral pode achar que é balela, que é preciso combater violência com violência. Os policiais arbitrários e violentos apenas refletem o pensamento de uma boa parte da sociedade. Eles acreditam que as leis são frouxas e cabe a eles "apertá-las". A visão da reencarnação e das leis de causa e efeito deve fazer com que nos vejamos todos como passageiros do trem da tolerância. Não temos o direito de fazer justiça com as próprias mãos. Já na política, a difusão de ideias de paz, da luta pela vida, contra o aborto, contra o consumo irresponsável de bebidas alcoólicas (se é que é possível consumir álcool com responsabilidade) e, principalmente, de honestidade, aponta para quem nos observa, que é possível ser policial, político ou qualquer outra coisa, sem se atirar nos braços da corrupção e dos abusos de todas as ordens. Fico feliz por ser reconhecido pela seriedade, e mais feliz ainda quando as pessoas fazem a ligação dessa conduta com a minha formação familiar e religiosa. 
Suas palavras finais ao leitor.
Leitor amigo, somos Espíritos em uma experiência física, de modo que precisamos cada vez mais cultivar os valores espirituais em detrimento dos materiais. A qualquer momento podemos deixar o corpo físico e isso não pode nos surpreender, nem mesmo impor qualquer tipo de insegurança ou angústia. Viemos da Pátria espiritual e para lá voltaremos. Não sabemos quando, mas podemos determinar como, ou melhor, com que bagagem. Cada dia é uma oportunidade de aprendizado e de progresso. Temos falhas inerentes ao nosso padrão de evolução e isso não nos deve impingir qualquer tipo de culpa, mas também não pode servir de desculpa para não corrigirmos comportamentos equivocados. A vida é uma grande escola, de onde todos sairemos com o diploma na mão. Uns passam direto, outros depois de exames, recuperações, dependências e ainda há aqueles que repetem, mas todos, cada qual ao seu tempo, nos formaremos. Deus, o Magnífico Reitor dessa Universidade, espera-nos incansavelmente. A felicidade é o nosso destino, mas não é uma dádiva gratuita. É uma conquista individual. Somos Espíritos imortais; rumamos inexoravelmente para o progresso. Não há motivos para sofrer. Sobram razões para lutar!

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