sábado, 22 de junho de 2013

JUDAS E AS INJUSTIÇAS DOS HOMENS

 
José Estênio Gomes Negreiros


Certamente influenciados pelos ensinamentos da Igreja Católica Apostólica Romana, aprendemos que Jesus Cristo nasceu a 25 de dezembro do ano 1 (um) da Era Cristã, e que morreu aos trinta e três anos, após um ministério de três anos. Essa contagem, pela ampulheta do tempo, teria sido instituída pelo monge Dionísio, O Pequeno, que viveu em Roma entre os anos 500 e 545, a partir da hipotética data de nascimento do Cristo, substituindo a maneira precedente que era feita a partir da fundação de Roma, isso até quinhentos anos após a morte de Jesus de Nazaré.
Segundo historiadores, o monge Dionísio teria traduzido várias obras eclesiásticas do Grego para o Latim e elaborado uma espécie de tabela com a data da Páscoa numa sequência de anos. A expressão “Era Cristã” teria sido cunhada por ele para designar os anos posteriores a 753 da fundação de Roma.
Para Ivan René Franzolim, há fortes indicações de que Jesus devera ter nascido no ano de 749 da fundação de Roma, portanto, quatro anos antes do que foi atribuído pelo monge Dionísio, sendo desconhecidos, todavia, o dia e o mês de Sua vinda ao mundo terreno. Acredita-se que foi o Imperador Constantino I, o Grande, que reinou entre 306 a 337, quem determinou, em 336, que o nascimento de Jesus deveria ser celebrado no dia 25 de dezembro em todo o Império Romano, aproveitando-se a comemoração do solstício de inverno no Oriente e o renascimento do Sol no Mediterrâneo. Oficialmente, essa data como dies natalis foi determinada pelo Padre Júlio I, que foi Papa entre 337 e 352.
Aliando as informações históricas às de Emmanuel, insertas no livro “Há Dois Mil Anos”, psicografado por Chico Xavier, é possível concluir que Jesus morreu na tarde do dia três de abril, numa sexta-feira, do ano 33, com a idade de trinta e seis ou trinta e sete anos, tendo o Seu ministério se realizado do ano 28 ao ano 33. Portanto, neste ano de 2013, quando reescrevemos este artigo, completam-se 1980 anos do retorno do Mestre de Nazaré ao Mundo Espiritual. 
Judas Iscariote – A Humanidade, sobretudo os povos adeptos da religião católica, nesses quase dois mil anos, relembram, a cada ano, por ocasião da chamada “semana santa”, o flagelo, o suplício, o julgamento e a morte de Jesus, numa repetição mórbida, sádica e trágica, mostrando um Cristo derrotado, vencido, lânguido. Durante esses dias ditos sagrados pelo Catolicismo, os homens, em fingida piedade, lamentam os suplícios infligidos a Jesus. Aqui, é oportuno recordar uma trova de autoria de Octávio Caúmo Serrano, citada por ele em seu excelente artigo “Jesus Morreu para nos Salvar”, publicado na “Revista Internacional de Espiritismo”, edição de março de 2008: Em seu sadismo que espanta/o homem sempre faz isto:/em cada semana santa/mata outra vez Jesus Cristo.
Nessa mesma ocasião, num contrassenso absurdo, valendo-se de uma impiedade que choca com os ensinamentos do Mestre Divino, outra personalidade é relembrada. Não de forma falsamente piedosa, mas com escárnio verdadeiro, com desprezo autêntico, com mofa genuína e mordacidade real. Essa personalidade é Judas Iscariote, um dos Doze Discípulos do Cristianismo Primitivo, substituído depois do seu suicídio pelo apóstolo Matias. Todos nós conhecemos a maneira de como ele é relembrado.
Não se sabe muito da genealogia de Judas Iscariote. O seu procedimento aviltante para com Jesus talvez seja o motivo de os Evangelistas pouco se referirem a ele.
Conforme o historiador judeu Flávio Josefo (37–103 d. C.), a alcunha Iscariote origina-se de Carioth ou Keriote, cidade natal daquele Apóstolo. Há registros históricos de que Judas Iscariote teria sido o tesoureiro da primitiva Comunidade Cristã, justamente por ser um hábil comerciante. Sabe-se ainda que Iscariote era um homem inteligente, de caráter amoroso e inquieto.
Afinal, o que terá motivado Judas a falir, traindo o Mestre? Foi sua ambição de poder ou foi por idealismo político-religioso? Ou foi simplesmente por orgulho e por inveja? São indagações que perduram até hoje sem uma resposta concludente, segura, tudo ficando no campo das conjecturas dos historiadores. 
A explicação dada por Judas Em entrevista concedida a Humberto de Campos, no livro “Crônicas de Além-Túmulo”, Judas revela que era apaixonado pelas ideias socialistas de Jesus, considerando-O o Novo Rei dos Judeus, tanto pelo Seu magnetismo divino, pelos fenômenos mediúnicos que praticava, quanto por Sua palavra esclarecedora. Diz Judas que via na política e na revolta popular o único instrumento que poderia viabilizar a libertação dos judeus, pois era hostil à dominação romana. Paralelamente, considerava o Mestre um sério obstáculo ao seu desejo de chegar ao poder, haja vista que Jesus tinha Sua opção pelos pobres e humildes, rejeitando o mando e a riqueza. Embora amasse profundamente o Filho de Maria, sua ambição e seu desejo de apressar a vitória fê-lo engendrar o plano que culminou com a crucificação e tudo o mais que conhecemos do Martírio.
Na obra “Os Quatro Evangelhos” encontram-se duas mensagens do próprio Judas e uma dos quatro evangelistas, todos, àquela altura, já no Plano Espiritual e sendo orientados ou assistidos pelos Apóstolos. Tais mensagens são assinadas em conjunto por José de Arimateia e por Simão de Cirene, as quais trazem elucidações sobre a traição. Na segunda mensagem transmitida por Iscariote ele assim se expressa: “Oh! Como é grande esse Deus que permite que o filho culpado encontre, na sua própria indignidade, o ponto de apoio que o ajudará a subir para a perfeição. Oh! quanto é bom Aquele que está sempre pronto a perdoar ao que sinceramente se arrepende, que pensa com Suas mãos benfazejas as chagas dos nossos corações culpados, que nelas derrama o bálsamo da esperança e as cicatriza com o auxílio da expiação!”
Ao fim das mensagens, os Evangelistas aditam: “(...) Judas é hoje um Espírito regenerado no crisol do arrependimento, do remorso, da expiação, da reencarnação e do progresso. Tornou-se um dos auxiliares humildes, ativos e devotados do Cristo. Este exemplo vos mostra que não deveis nunca repelir qualquer de vossos irmãos e ainda menos excluí-lo da paz do Senhor”. 
Uma mensagem de Judas Outra tocante mensagem de Judas vamos encontrar no livro “Vida e Atos dos Apóstolos”, de Cairbar Schutel. Tal comunicação foi recebida no dia 12 de setembro de 1916 na cidade do Rio de Janeiro, por via mediúnica, e comprovada por um vidente, que disse ter visto no instante da transmissão “um homem de barbas e cabelos pretos, trajando vestes brancas, muito alvas, circundado de um grande halo de luz azul-claro que contornava outra luz de um azul-escuro aveludado. Em torno do Espírito, espalhados, flutuavam flocos de luz verde, sendo deslumbrante o efeito da aparição”.
Por se tratar de uma belíssima oração de louvor a Deus e a Jesus-Cristo, reproduzimo-la na íntegra:
“Judas, meus bons amigos, volta hoje ao mundo para declarar perante os homens as verdades que lhe foram inspiradas por Nosso Senhor Jesus Cristo – o Grande e Amado Mestre – a quem, num momento de cegueira, de trevas e extrema fraqueza, traiu, vendendo-o aos inimigos.
Jesus, meus bons amigos, o Messias, Aquele que foi enviado por Deus para salvar o Mundo onde viveis hoje, já perdoou a Judas Iscariote a sua fraqueza e cegueira. Deus, em Sua misericórdia infinita, concedeu, pela boca de Seu Filho amado, o perdão àquele que foi outrora infiel, traidor, perjuro, falso e criminoso discípulo do Messias, que jamais deixou de lamentar e compadecer-se da fraqueza e miséria de seu discípulo.
Venho, meus bons amigos, em nome do meu Querido Mestre – o Salvador do Mundo – dizer-vos alguma coisa que vos interessa. Compareço à vossa presença, a fim de restabelecer a verdade desvirtuada, falseada pelos homens interessados em se conservar no caminho do erro e da mentira. Estou diante de vós, meus bons amigos, para me confessar agradecido pelas imensas provas de amor que me foram dispensadas por Deus e por Nosso Senhor Jesus Cristo.” 
Judas reconhece seus erros “Apareço aqui, perante vós, meus companheiros e amados irmãos, para penitenciar-me dos erros que pratiquei e, ao mesmo tempo, entoar hinos à Infinita Sabedoria e à pureza imaculada Desse Mestre admirável, à incomparável bondade Desse coração todo feito de doçura e de amor! Venho cantar hosanas à sublime sabedoria do Criador e erguer uma prece, na qual todos vós deveis acompanhar-me, pois, nesta oração subiremos até junto do Pai Celestial e de Jesus, que, nesta hora, estendem as vistas misericordiosas sobre este Planeta atrasado, mundo de expiações e sofrimentos, de lágrimas e de dores.
Dizei comigo, meus queridos irmãos: ‘Jesus, nosso Salvador, Filho de Deus e Luz Sublime que clareia o nosso caminho, que nos guia na Terra e na Eternidade! Senhor, aqui estão os Teus filhos, tendo à frente aquele que no Mundo errou profundamente, o maior de todos os criminosos que pisaram a superfície deste Planeta; aqui estamos todos nós, Senhor, tendo à nossa frente o mais pérfido e infiel dos Teus discípulos; aqui nos achamos todos nós, de pé, junto do mais fraco criminoso dos teus filhos – Judas Iscariote! Nós, Senhor, somos também fracos, praticamos grandes erros, pesam sobre nós imensas culpas, grandes pecados nos obrigam a curvar a fronte diante de Ti, Senhor! Temos, Jesus, a nossa alma coberta de chagas, o nosso coração envenenado pelos mais impuros sentimentos que nele temos alimentado; sentimos o nosso espírito combalido ao rever o nosso passado espiritual, cheio de crimes e faltas graves; somos, Senhor, ainda escravos da matéria, sentindo as entranhas devoradas pelos desejos pecaminosos, a alma presa, agrilhoada à matéria que a retém na superfície da Terra, de onde não poderá desprender-se para as luminosas regiões sem primeiro expurgar-se das impurezas e das máculas que os pecados deixaram sobre ela e onde os vícios produziram sulcos profundos, as misérias da carne lançaram vestígios que dificilmente se apagarão! Temos, bom Jesus, as mãos tintas do sangue dos nossos irmãos, os pés cheios de lama pútrida dos antros e dos monturos por onde caminhamos durante longo tempo; conservamos também nas mãos o azinhavre da moeda a troco da qual vendemos a nossa consciência, atraiçoamos os nossos irmãos; guardamos ainda nos lábios os sinais das nossas abjeções, da impureza das paixões que alimentamos em nossos corações; trazemos estampados na fronte os estigmas das nossas baixezas, das podridões, misérias e devassidões a que nos entregamos na vida; conservamos nos olhos os traços das nossas crueldades, o brilho das volúpias e prazeres criminosos que durante esta experiência terrena temos desfrutado.” 
A prece prossegue “O nosso corpo, Senhor, é o livro onde se acha escrita a história dos nossos abusos e das nossas transgressões; a nossa alma, Jesus, é o espelho onde neste instante se refletem todos os nossos atentados às leis de Deus, todas as violações do Teu Evangelho; a nossa consciência é, nesta hora, sudário onde se acha estampada a Tua efígie, mas tão apagada que dificilmente a reconhecemos.
Senhor Jesus! Querido e adorado Mestre! Todos os nossos pecados se acham gravados em nosso espírito; todas as nossas culpas estão desenhadas na nossa consciência, que nos acusa diante de Ti e de Teu Pai!
São grandes as nossas faltas, imensos os nossos pecados, infinitos os nossos erros, mas na Tua bondade há sempre lugar para todos os perdões; em Tua alma existem grandes reservas de misericórdia e tolerância; no Teu incomensurável coração há um transbordar constante de piedade e de amor para os que sofrem, que gemem e choram, os fracos, os infelizes e os pecadores, como nós!
Recebe, portanto, bom Jesus, esta prece que te oferecemos e que é pronunciada pelos lábios mais impuros que já existiram sobre a Terra, ditada pela consciência mais sombria que palpitou num ser humano, traçada pela mão mais criminosa que já existiu neste Planeta; prece nascida da alma mais culpada que este Mundo conheceu até hoje, o espírito mais fraco e criminoso dos que se têm encarnado na Terra. Aceita, Senhor, Bom Jesus, a prece que Judas, o traidor de ontem, o falso e o pérfido de outros tempos, nos faz recitar neste momento na Tua presença para que possamos, como ele, alcançar o nosso perdão, merecer da Tua bondade a graça de recebermos do Teu Pai a mesma luz e a mesma paz que Ele concedeu ao mais cruel, ao mais criminoso e infame dos Seus filhos! Ouve, Jesus, a nossa prece e dá-nos o que deste a Judas pelo mal que ele Te fez, pela traição que praticou contra a Tua pessoa divina, pelo ultraje que infligiu a Ti, no momento mais doloroso da Tua vida de Missionário, de Redentor, de Salvador do Mundo e Filho de Deus!” 
Não julgueis, diz Lamennais “Tu, que tiveste em Tua alma a grandeza, a doçura e o amor para perdoar a esse falso e perjuro discípulo, Senhor, perdoa-nos também a nós, cujos erros, cujas faltas, crimes e pecados estão mui distantes do crime e do pecado daquele que se acha à nossa frente, nesta hora de luto e de dor, para render graças à infinita misericórdia de Deus e o imenso e inesgotável manancial de doçura, carinho, afeto, pureza e imenso amor – o coração de Jesus! Perdoa-nos, Senhor! Salva-nos, Jesus’.”
Eu direi também:
“Meu Jesus! Meu Salvador! Se mereci o Teu perdão e a Tua misericórdia, os meus irmãos podem também merecê-los, pois diante de Judas, a Humanidade inteira, com todos os seus crimes, os seus pecados e as suas misérias, é santa, inocente como a mais inocente das criancinhas que brincam na superfície da Terra! Perdoa, portanto, Senhor, a Humanidade, como perdoaste ao maior dos traidores!”.
O injusto julgamento que ainda hoje dele fazemos, bem como as diatribes que nós, ditos cristãos, lançamos contra Judas Iscariote, ontem um criminoso abjeto e hoje, seguramente, integrante das falanges celestiais de Espíritos purificados, devem nos envergonhar, pois somos tão ou mais infratores perante as Leis Divinas do que ele foi naqueles recuados tempos de sua vivência terrena.
Deveríamos nos lembrar, diariamente, de um trecho de uma mensagem deixada pelo Espírito Lamennais, transmitida em Paris, em 1862, e que consta do capítulo XI, item 14, do “O Evangelho segundo o Espiritismo”, de Allan Kardec: “Não julgueis, oh! não julgueis, meus caros amigos, porque o julgamento que fizerdes vos será aplicado mais severamente ainda, e tendes necessidade de indulgência para os pecados que cometeis sem cessar. Não sabeis que há muitas ações que são crimes aos olhos do Deus de pureza, e que o mundo não considera sequer como faltas leves?”

Fontes:  
Artigo “Do Orgulho à Humildade: Judas e o Perdão”, de Roosevelt Pinto Sampaio, in “Reformador” de setembro de 1999.
“Vida e Atos dos Apóstolos”, de Cairbar Schutel.
“Há Dois Mil Anos”, do Espírito Emmanuel/Chico Xavier.
“O Evangelho segundo o Espiritismo”, de Allan Kardec. 

RETIRADO DE O CONSOLADOR UMA REVISTA DE DIVULGAÇÃO ESPÍRITA


 




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