A morte e os seus mistérios
Ernesto
Bozzano
Parte
10
Continuamos o estudo do clássico A morte e
os seus mistérios, de Ernesto Bozzano, conforme tradução de Francisco
Klörs Werneck. O estudo será aqui apresentado em 24 partes. Nossa expectativa
é que ele sirva para o leitor como uma forma de iniciação aos chamados
Clássicos do Espiritismo.
Cada parte do estudo compõe-se de:
a) questões preliminares;
b) texto para leitura.
As respostas às questões propostas encontram-se no
final do texto abaixo.
Questões preliminares
A. De que trata a segunda monografia que integra a
obra em estudo?
B. Que fatos compõem o primeiro caso relatado na
monografia?
C. Que acontecia com Regina Fischerin durante os
fenômenos?
Texto para leitura
137. A 2ª Monografia de que trata esta obra tem o
título “Marcas e impressões supranormais de mãos de fogo”.
138. O professor Charles Richet publicou em 1905,
nos Annales des Sciences Psychiques, um artigo intitulado
"Fenômenos metapsíquicos de outrora", no qual traduziu do latim uma
crônica do ano de 1654, relativa aos "milagres" operados por um
Espírito que se manifestou a uma moça chamada Regina Fischerin, residente em
Presburg, na Hungria. Entre os milagres em referência, registraram-se a
impressão inflamada de uma mão do Espírito, que ficou gravada num tecido, e
outras impressões do mesmo gênero, em forma de cruz, traçadas na mão da
vidente. Uma fototipia dessas impressões foi reproduzida no artigo.
139. Em 1908 e 1910, o Sr. Francesco Zingaropoli,
advogado em Nápoles, publicou, por sua vez, na revista Luce e Ombra,
dois longos estudos sobre o mesmo assunto, e, depois de citar o caso relatado
pelo Sr. Richet, acrescentou doze outros casos semelhantes, todos tirados de
crônicas antigas. Ele tratou igualmente das impressões de mãos de fogo gravadas
em roupas brancas e outras vestes e nos corpos dos percipientes, por fantasmas
de defuntos. Na maior parte dos casos, essas manifestações eram acompanhadas de
diálogos com os Espíritos, assim como de fenômenos supranormais diversos, em
grande parte semelhantes aos que se produzem em nossos dias.
140. Infelizmente, porém, a insuficiência da
documentação dessas narrações antigas leva-me a não grupá-las em uma
classificação científica, ainda que o Sr. Zingaropoli tenha razão em notar que
as relações de circunstâncias existentes entre essas diversas manifestações
contribuam, de modo elevado, em favor de sua autenticidade. Em uma
classificação científica, devem-se eliminar inexoravelmente elementos que
apresentem lacunas ou defeitos, sem o que seria inútil submeter os fatos aos
processos de análise comparada.
141. De qualquer forma, observarei sempre a
respeito dos fatos em questão que, mesmo que se quisesse relegar para as
"lendas místicas" quase todos os casos que as compõem (o que não
constituiria uma decisão racional), eles não deixariam de apresentar certo
interesse introdutivo. Com efeito, assim como fez notar o Prof. Richet,
"ninguém teria pensado em imitar ou inventar manifestações supranormais de
uma ordem muitas vezes estranha e inesperada, se manifestações autênticas da
mesma natureza não tivessem ocorrido antes".
142. Folheando com cuidado minhas classificações,
encontrei vários casos dessa natureza; a maior parte, porém, é infelizmente
tirada também de crônicas antigas, insuficientemente documentadas. Achei
alguns, todavia, que se recomendam pelo nome autorizado das pessoas que os
recolheram; observei, além disto, entre eles, dois pequenos incidentes que se
renovaram mediunicamente em nossos dias, nos quais mãos de fantasmas provocaram
a queimadura e a inflamação da parte do corpo das pessoas em que tocaram.
143. CASO I - Começo por mencionar os fatos,
apresentando antes um resumo do caso narrado pelo Prof. Richet, assim como dois
outros bem documentados, citados pelo Dr. Zingaropoli.
144. A crônica latina traduzida pelo Prof. Richet
foi pela primeira vez publicada em 1654, por ordem de Monsenhor Jorge Lippai,
Arcebispo de Sttigont. Ela está guardada no "Venerável Capítulo" de
Pest. A narrativa diz que vivia em Presburg um alemão chamado João Klemens, que
se convertera à religião luterana, mas que, mais tarde, quando já velho,
voltara ao catolicismo, tendo falecido aos 60 anos. Vivera ele de modo pouco
louvável e, depois de morto, aparecera a várias pessoas, mas a crônica em
referência se ocupa mais especialmente de suas manifestações a uma moça de
Hallstad, Áustria, chamada Regina Fischerin, de 19 anos, católica fervorosa e
de costumes irrepreensíveis.
145. Passo por cima das manifestações que nada têm
com o assunto de que nos ocupamos aqui: fenômenos luminosos, transportes e
deslocamentos de objetos, "voz direta", que conversou com os padres
teólogos que acorreram ao local e que reconheceram, como verdadeira, a voz do
defunto.
146. É de notar, também, que numa circunstância em
que se produziam os mais interessantes fenômenos de transporte de objetos sem
contato, sob uma direção evidentemente inteligente, "Regina ficava sem
conhecimento e como inanimada, durante duas horas", ao passo que noutro
trecho diz que "Regina, manifestamente esgotada por todas essas provas,
adormecia profundamente".
147. Estas duas preciosas passagens demonstram que
a vidente era médium e que caía em transe no momento em que se produziam os
fenômenos físicos, o que serve para demonstrar a autenticidade dos fatos
relatados.
148. Passo agora a citar os episódios que nos
interessam. Em dado ponto, o narrador diz que o Espírito se mostrava irritado e
violento, batia portas e arrastava cadeiras ao tempo em que Regina perdia o uso
da fala e ficava desmaiada por algum tempo. O pai aconselhou a filha a procurar
agarrar o Espírito para imobilizá-lo. A filha obedecia, mas nada retinha em
seus braços: foi assim que ela se apercebeu de que se tratava de uma sombra vã.
149. A crônica continua assim: "Temendo,
então, ser vítima de uma ilusão, ela disse ao Espírito que, se ele fosse um
Espírito bom, a tocasse com o dedo. Ele a tocou no braço direito, o que sentiu
com fogo. Subitamente, apareceu no lugar tocado uma bolha com a dor que produz
uma queimadura e os criados a viram. Depois, a fim de verificar se não se
tratava da obra de um Espírito mau, Regina pediu-lhe, como prova de que era um
Espírito bom, que fizesse o sinal da cruz. ‘Eis, disse ele, o que me pedes.’ Na
mesma ocasião, sobre a sua roupa, mostra uma cruz de chamas e queima,
profundamente, a mão de Regina, deixando impressa nela uma cruz que todos
puderam ver. A moça, porém, desejando provas mais amplas, pede ainda outro
sinal. Mostra-lhe cartas que o Bispo de Smirna escrevera e assinara, e nas
quais perguntava diversas coisas que a moça ignorava. O Espírito respondeu que não
sabia ler cartas; iria, entretanto, dar satisfação; então segurando as cartas
com seus três primeiros dedos, sua mão sendo, sem dúvida, uma mão de chamas,
atravessou-as, como se fossem postas ao contato de uma chama. Recordou, a
seguir, com dor, o crime que cometera, dizendo que o dinheiro produzido pelo
crime existia ainda (o que se verificou, em seguida, ser verdade), que uma
parte servira para encargos domésticos e que a outra devia servir para outros
fins.”
150. Regina continuou a pedir-lhe outras provas,
apesar da cruz na mão ser já uma prova muito apreciável. Isto, todavia, não
bastou à Regina que, para ficar certa da presença de um Espírito bom, lhe pediu
que fizesse o mesmo sinal em uma moeda. O Espírito obedeceu, tomou a moeda,
jogou-a no chão e arrancando das mãos da moça um pano, atirou-o sobre ela;
depois, segurando-lhe uma das mãos, com força e, queimando-a profundamente,
como dantes, nela imprimiu o desenho de uma tríplice cruz. "Eis outro
sinal", disse ele, e isto fez com tanta força que a chama atingiu a moça e
foi tocar na parede que estava defronte. Regina tombou desmaiada.
Sua irmã viu e ouviu tudo isto, e mais tarde os criados puderam ver, com seus
próprios olhos, as queimaduras produzidas no pano e na moeda. E muitas pessoas
puderam ver e tocar as marcas no pano, o dinheiro, assim como as cartas
queimadas.
151. O fato é extraordinário. Primeiro porque uma
cruz e uma impressão de mão direita ficaram marcadas, em seguida porque a marca
de fogo não ultrapassou seus traços, embora, no pano que arde, o fogo tenha
tendência para estender-se. Finalmente, a mão direita, que ficou marcada,
representa exatamente a mão direita de Klemens, como se fosse sua mão material.
Com efeito, quando vivo, uma parte do dedo indicador fora cortada por um cirurgião,
devido a uma enfermidade que se chama "Vermes", o que se verificou na
marca supranormal produzida.
152. A narração desses fatos é antes confusa e em
parte insuficiente; mas não se poderia pretender de um narrador de três séculos
atrás a precisão científica nem a clareza literária que se exigiria em uma
narração moderna dos fenômenos metapsíquicos. Assim, por exemplo, o fenômeno
mais importante, o da mão em brasa que ficou gravada na fazenda, é nela
relatado de modo imperfeito. Felizmente, essa impressão de mão foi conservada
até nós e testemunha a autenticidade do fenômeno e da perfeita conformação da
impressão obtida com a prova de identificação constituída pela falta da
falangeta do dedo da mão direita.
153. O Prof. Charles Richet analisou o caso com uma
prudência extrema, distinguindo os fenômenos que teriam sido produzidos pela
intervenção consciente de Regina daqueles em que sua intervenção parecia muito
duvidosa ou inadmissível. Mas Richet não considerou que Regina caía em transe
no momento em que eram produzidos os mais importantes fenômenos físicos e
também se esqueceu da "voz direta" que foi reconhecida por alguns
padres como sendo a do falecido João Klemens.
154. A propósito dos fenômenos que estudamos aqui,
escreveu o Prof. Richet: "Os fenômenos relativos à impressão da mão de
fogo no pano e do estigma em forma de cruz na mão são de explicação um pouco
delicada. Certamente que não é impossível reproduzir-se marcas de fogo em
cartas, mas numa fazenda, fazer a impressão de uma mão (semelhante ou não à mão
do defunto Klemens) é coisa um pouco mais difícil e seria uma fraude
habilíssima, se tivesse havido fraude; imprimir num pano de linho a marca de
uma mão que queima o tecido é outra coisa. Não se pode contestar, creio, que a
marca foi feita."
155. Tudo bem considerado, o professor Richet
termina dizendo que os fatos estão provados e que a narração é verdadeira.
Quanto à interpretação de alguns desses fatos, escreveu: "Há também as
bolhas e a marca de uma cruz na mão de Regina. Não acreditamos que se trate de
fenômenos simulados ou falsificados, porque sabemos, de fonte limpa, que os
estigmas podem aparecer nos histéricos, com formas determinadas, sob a
influência de uma emoção moral ou de um delírio religioso. São fatos
cientificamente estabelecidos, provando apenas a influência das emoções
cerebrais sobre a circulação e o tropismo da pele."
156. Esta interpretação poderia ser admitida para a
bolha no braço e para cruz na mão, mas como servir ela para o mesmo fenômeno
capital da mão de fogo que ficou gravada no pano? Aqui, a tese dos estigmas por
autossugestão não tem lugar. E, se assim é, se esta hipótese não pode explicar
o conjunto dos fatos, não deverá ser admitida para a bolha no braço e a cruz na
mão, tanto mais que, nas circunstâncias em apreço, a vidente não pensava de
modo algum na possibilidade de produzir esses fenômenos, e não podia, pois,
autossugestionar-se graças a uma "emoção moral intensa" nesse
sentido.
Respostas às questões preliminares
A. De que trata a segunda monografia que integra a
obra em estudo?
Com o título “Marcas e impressões supranormais de
mãos de fogo”, Bozzano trata nessa monografia de fatos surpreendentes em que o
agente do fenômeno, valendo-se do fogo, produz sinais e marcas nos sensitivos e
em objetos diversos. (A morte e os seus mistérios, 2ª Monografia –
Marcas e impressões supranormais de mãos de fogo.)
B. Que fatos compõem o primeiro caso relatado na
monografia?
Conforme relato que devemos ao professor Charles
Richet, no ano de 1654, um Espírito se manifestou a uma moça chamada Regina
Fischerin, residente em Presburg, na Hungria. Entre os fatos ocorridos,
registraram-se a impressão inflamada de uma mão do Espírito, que ficou gravada
num tecido, e outras impressões do mesmo gênero, em forma de cruz, traçadas na mão
da vidente. Uma fototipia dessas impressões foi reproduzida por Richet. (Obra
citada, 2ª Monografia – Caso I.)
C. Que acontecia com Regina Fischerin durante os
fenômenos?
Regina ficava sem conhecimento e como inanimada,
durante duas horas. Segundo o relato, manifestamente esgotada por todos esses
fatos, ela adormecia profundamente, o que indica que a vidente era médium e que
caía em transe no momento em que se produziam os fenômenos de efeitos físicos.
(Obra citada, 2ª Monografia – Caso I.)
Observação:
Para acessar a Parte 9 deste estudo,
publicada na semana passada, clique aqui: https://espiritismo-seculoxxi.blogspot.com/2019/11/a-morte-e-osseus-misterios-ernesto_29.html
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Postado
por Astolfo Olegário de Oliveira
Filho às 07:00 Nenhum comentário:
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