A morte e os seus mistérios
Ernesto
Bozzano
Parte
12
Continuamos o estudo do clássico A morte e
os seus mistérios, de Ernesto Bozzano, conforme tradução de Francisco
Klörs Werneck. O estudo será aqui apresentado em 24 partes. Nossa expectativa
é que ele sirva para o leitor como uma forma de iniciação aos chamados
Clássicos do Espiritismo.
Cada parte do estudo compõe-se de:
a) questões preliminares;
b) texto para leitura.
As respostas às questões propostas encontram-se no
final do texto abaixo.
Questões preliminares
A. O Caso III menciona três fenômenos bem
distintos. Quais são eles?
B. O Caso IV apresenta também, além da queimadura,
outro tipo de fenômeno. Qual é ele?
C. Se o Purgatório não existe, por que em alguns
casos citados nesta obra os Espíritos disseram encontrar-se nele?
Texto para leitura
167. Casos III e IV – É chegado o
momento de citar dois pequenos incidentes que se produziram mediunicamente mais
recentemente. O primeiro se produziu no decurso das famosas experiências do
Rev. William Stainton Moses.
168. Eis como a Sra. Speer dele fala em data de 18
de abril de 1873: "Nosso círculo recomeçou suas sessões depois de uma
interrupção de três semanas. Obtiveram-se os fenômenos físicos habituais, mas,
em seguida, manifestou-se o Espírito de uma pessoa falecida há pouco, que a
médium conhecera muito antes. Anunciou sua presença com golpes muito fortes e
sua influência logo apareceu a todos repulsivo. A médium via o Espírito sentado
no tamborete de harmônio, olhando-a em atitude zombeteira. Fez com que se visse
que se tratava de um Espírito muito atrasado; quis infelizmente tocar a mão da
médium e esta se queixou de uma queimadura de carne no lugar em que o Espírito
tocara. Com efeito, uma bolha de uma cor vermelha formara-se nesse lugar."
(Light 1892, pág. 627).
169. O segundo dos incidentes aconteceu em Leipzig,
na casa do engenheiro Paul Horra, tendo sido registrado no número de julho
do Die Uebersinnliche Welt. Foi numa sessão com o
famoso médium de transportes Heinrich Melzer, de Dresden, que fora encerrado
num saco guarnecido de mangas e de uma abertura onde introduziu a cabeça. As
mangas eram fixas e seladas. Obtiveram-se numerosos transportes, entre os quais
duas plantas inteiras, com os vasos onde tinham sido plantadas. Os ramos e os
botões foram achados intactos, ainda que uma das plantas fosse de uma espécie
extremamente delicada. Foram depositadas nas mãos de dois experimentadores, um
dos quais sentiu, ao mesmo tempo, a dor de uma queimadura no dedo polegar.
Acendeu-se a luz e viu-se que, nesse lugar, se formara a marca de uma
queimadura com uma bolha.
170. Tais são os dois incidentes que se produziram
mediunicamente. Compreende-se facilmente que constituem uma confirmação eficaz
dos casos análogos que se produziram há séculos. Ora, esta confirmação
reveste-se de um valor teórico notável. Com efeito, os modestos incidentes que
acabo de narrar, se autênticos, bastam por si sós para demonstrar a existência
real dos fenômenos das impressões de mãos de fogo. Por outro lado, os dois
casos de natureza mediúnica servem, também, para eliminar a hipótese dos
estigmas por autossugestão, considerando-se que é necessário excluir deles toda
forma de crise emotiva nos percipientes, que não esperavam, de modo algum, o
que se ia produzir. Ademais, estando esses experimentadores familiarizados, de
há muito, com os fenômenos mediúnicos, assistiam às manifestações com perfeita
serenidade de espírito.
171. Voltando ao caso em questão, vou resumir os
fatos, observando que nos encontramos em face de cinco impressões de fogo
feitas em roupas e objetos e uma gravada na pele da percipiente. É, pois,
evidente que a hipótese dos estigmas por autossugestão não é admissível,
considerando-se que só serviria para explicar, até certo ponto, um único episódio
dos seis casos que se produziram.
172. Ainda uma observação: O Espírito comunicante
afirmava estar no Purgatório, ou melhor, julgava ali estar. Ele disse à
percipiente que "o Senhor, por intermédio dela, lhe abreviara o tempo que
deveria passar no Purgatório". Em numerosos casos extraídos de crônicas
antigas, essas afirmações concordam entre si e o Sr. Zingaropoli comenta suas
concordâncias, tendendo para as mesmas considerações que constituiriam mais
tarde o fundamento teórico de minha obra A crise da morte.
173. Com efeito, escreve ele: "Todas essas
almas pecaram e temem merecer de Deus um justo castigo; para todas, o fato de
crerem encontrar-se em punição lhes faz experimentar as dores da expiação, tal
como lhes foi ensinado na Terra."
174. Isto efetivamente acontece e a análise
comparada que escrevi a respeito, na obra que acabo de citar, faz também
sobressair que o poder criador do pensamento torna transitoriamente reais e
espirituais ou etericamente objetivas as condições do meio espiritual
imaginado.
175. O Sr. Vicenzo Cavalli, citado pelo Sr.
Zingaropoli, desde então manifestara a mesma ideia, nos seguintes termos:
"Na segunda vida, sabemos que crer é sentir e sentir equivale a ser, por
causa do grande poder da imaginação”.
176. Essas intuições dos Srs. Zingaropoli e Cavalli
são notáveis para a época em que foram feitas, considerando que só mais tarde
cheguei às mesmas conclusões, pelos processos da análise comparada e da
convergência das provas aplicadas a grande número de fatos. Nestas condições e
voltando às afirmações dos Espíritos que se comunicam, apresso-me a notar que,
ainda que os teólogos concordem em suas interpretações sobre as impressões das
mãos de fogo, explicadas pela lenda do fogo e das chamas do Purgatório e do
Inferno, nenhum dos Espíritos comunicantes jamais disse, de qualquer modo,
encontrar-se no meio de fogo e de chamas. Eles afirmam unicamente estar num
plano espiritual de expiação, que chamam de Purgatório, conforme lhes foi
ensinado.
177. Caso V – Este caso, muito bem
documentado, foi igualmente tirado da monografia do advogado Zingaropoli (Luce e
Ombra, 1910, págs. 614-7). O Dr. Zingaropoli reproduziu, na íntegra, as
passagens mais emocionantes da narração assinada pela Madre Abadessa e as Irmãs
decanas do Convento das Terciárias Franciscanas de Santana de Foligno,
província de Perúgia, a qual foi confirmada por outras testemunhas, como
adiante se verá.
178. A falecida que se manifestou chamava-se Irmã
Teresa Margarida Giesta. Nasceu em Bástia, Córsega, a 15 de março de 1797, e
era filha de um rico negociante. Levada à contemplação, renunciara à facilidade
da vida profana e vestira o hábito religioso a 24 de outubro de 1836, no
Convento das Terciárias Franciscanas de Foligno, onde desencarnou em 4 de
novembro de 1853.
179. Eis o relato feito pela Madre Abadessa Maria
Vitória Constância Vichi: "No dia 5 solenes exéquias foram realizadas e a
6, como se devia inumá-la, pensou-se a princípio em colocá-la num lugar
especial; mas se decidiu, em seguida, fazer-lhe um caixão de tábuas, coisa que
não se fizera ainda, e enterrá-la no túmulo comum das religiosas. Enquanto se
esperava, o confessor da comunidade, Padre Lourenço, de Solero, perto de
Alexandria, no Piemonte, após ter escrito algumas indicações sobre a defunta, colocou
o escrito num frasco de vidro que depositou ao lado do corpo, no esquife, e
pronunciou as seguintes palavras, na presença das outras religiosas: ‘Nada
quero dizer sobre os dons com que ela foi favorecida por Deus, porque, se ela
quiser alguma coisa, far-se-á ouvir.’ O caixão foi fechado e descido ao túmulo.
Três dias apenas haviam transcorrido após o falecimento, quando uma voz lúgubre
e lastimosa começou, de quando em quando, a fazer-se ouvir no quarto em que a
Irmã Teresa morrera ou nas peças ao lado deste, mas não se deu nenhuma
importância ao fato, pensando-se que se tratava de uma alteração da fantasia de
religiosas tímidas e crédulas”.
180. Prossegue o relato: “No dia 16 do mesmo mês de
novembro, às 10 horas da manhã, a Irmã do coro Ana Feliciana Menghini, de
Montefalco, mais corajosa do que suas companheiras, que fora à grande sala de
roupas brancas para cumprir alguma ordem que lhe deram, quando subia a escada
ouviu um gemido abafado e creu reconhecer, nesse som, a voz da defunta
companheira de trabalho, Irmã Teresa Margarida. Todavia, armou-se de coragem,
pensando: ‘Trata-se, talvez, de um gato fechado num dos armários da parede.’
Abriu então um desses armários, mas nada encontrou. O queixume se fez ouvir de
novo. A Irmã abriu outro armário, e nada, porém, tendo encontrado, fechou-o
assim como ao primeiro, quando um terceiro gemido se fez escutar. Abriu ainda
outro armário sem nada descobrir. Então, a religiosa, espantada, exclamou:
‘Jesus, Maria! Que é que há?’ Havia, apenas, acabado de pronunciar estas
palavras, quando a voz lúgubre da defunta, com um suspiro penoso, exclamou:
‘Meu Deus, como eu sofro!’ Isto ouvindo, a Irmã Ana Feliciana tremeu e
empalideceu, reconhecendo claramente a voz da morta, Irmã Teresa Margarida”.
181. Retomando a coragem, a irmã perguntou:
"Por quê?" E a defunta respondeu: "Pela pobreza".
"Como, replicou a outra, você era assim tão pobre?" “Não é por mim,
retorquiu a morta, é pelas religiosas! Se basta um, por que dois ou três?
Agora, preste a atenção.” Com estas palavras, o quarto encheu-se de densa
fumaça e a sombra da defunta se dirigiu de um dos armários para a escada,
continuando a falar, sem que Ana Feliciana, sempre tomada de espanto, pudesse
compreender o que dizia. Chegando à porta, a defunta disse em alta voz: "É
uma misericórdia, aqui não mais voltarei e em sinal disto...". Nesse
momento, deu na porta uma pancada bem clara e logo a fumaça se dissipou e o
grande quarto tornou-se claro.
182. O relato refere, em seguida, a descrição da
agitação que produziu no convento a notícia do que acontecera, depois do que a
narrativa continua assim: "As monjas correram todas para o aposento da
Abadessa e em torno da Irmã Menghini se comprimiram para ouvir de sua própria
boca a narração do que se produzira. Ela lhes contou o que sucedera e as
religiosas, sabendo que a defunta houvera dito: Em sinal disto.... e que dera
uma pancada na porta, exclamaram logo: ‘Ela deve então ter deixado algum
sinal!’. A Irmã Menghini respondeu: ‘Nada sei a respeito. Estava muito
aterrorizada para pensar em examinar a porta.’ Então, as Irmãs em conjunto
foram examinar a porta e acharam nela gravada a mão da Irmã Teresa Margarida,
de modo mais perfeito do que teria feito o artista mais competente, por meio de
uma mão de ferro em brasa."
183. O relatório continua narrando um sonho que
teve nessa noite a Irmã Ana Feliciana. A defunta apareceu-lhe para agradecer às
companheiras o efeito benéfico de suas preces. E acrescentou: "Pensas em
apagar da porta a impressão de minha mão. Jamais o conseguirás, mesmo com o
auxílio de outras pessoas. Trata-se de uma misericórdia de Deus, de um aviso, e
sem isto nunca seria eu acreditada”.
184. Tendo sabido do que se passara, o arcediago de
Foligno, no dia 23 do mesmo mês, fez redigir uma ata do fato. Abriu-se então o
túmulo, aplicou-se a própria mão da morta a impressão que deixara na porta e as
testemunhas que fizeram vir atestaram que a mão se adaptava perfeitamente na
impressão. A impressão foi em seguida coberta com um véu que a ocultava e a
porta, tirada dos gonzos, foi guardada num lugar reservado. Mais tarde, sempre
por ordem do arcebispado, levantou-se o véu e permitiu-se a todos os pedintes
vê-la claramente. Depois, para maior precaução, fez-se uma cornija de cristal
com fechadura e a impressão da mão ficou assim bem guardada.
185. O relatório está assinado pela Madre Abadessa,
Irmã Vitória Vichi, pelas Irmãs decanas Maria Eleta Bertoccini, Ana Teresa
Giovagnoni, Maria Conceta Folcri, Ana Feliciana Menghini, Maria Madalena
Minelli e pela Irmã vigária Maria Angelina Torelli. Seguem-se outros
testemunhos datados de 2 de julho de 1870: são os do Padre Vicente Amoressi, da
Ordem dos Pregadores, e do Padre Joaquim Priore Medori, pró-vigário Geral.
Enfim, o Padre José Sensi, guardião dos Menores Observadores de São Bartholomeu,
certifica o que segue, com data de 4 de abril de 1871: “O relatório da abadessa
de Santana está conforme os testemunhos recolhidos por ela, que podem ser
considerados como não duvidosos, levando-se em conta as circunstâncias
precedentes, posteriores e concomitantes dos tempos, lugares e pessoas, segundo
as regras da sã moral católica e da exatidão crítica.”
186. Como se vê, o caso está confirmado por
testemunhos irrecusáveis, tendo sido escrito logo após os acontecimentos e deu
lugar a um inquérito imediato, ordenado pelas autoridades eclesiásticas, no
qual se encontra o detalhe muito notável do túmulo aberto para se fazer a
confrontação da impressão da porta com a mão da morta. É preciso notar que
ainda esta vez não se trata de um fato com a Antiguidade de alguns séculos, mas
de um que se passou em 1859, isto é, em uma época relativamente recente.
Respostas às questões preliminares
A. O Caso III menciona três fenômenos bem
distintos. Quais são eles?
Este caso está relacionado com as experiências
feitas pelo Rev. William Stainton Moses. O primeiro fenômeno consistiu nos
golpes muito fortes com que o Espírito anunciou sua presença. Em seguida,
ocorreu o fenômeno de vidência mediúnica pela qual a médium viu o Espírito
sentado em um tamborete. O terceiro foi o toque do Espírito na mão da médium, o
que produziu uma queimadura no lugar em que o Espírito tocou. (A
morte e os seus mistérios, 2ª Monografia – Marcas e impressões supranormais
de mãos de fogo, Caso III.)
B. O Caso IV apresenta, além da queimadura, outro
tipo de fenômeno. Qual é ele?
O fenômeno de transporte. Os fatos ocorreram em
Leipzig, na casa do engenheiro Paul Horra, com a presença do médium de
transporte Heinrich Melzer, de Dresden. Obtiveram-se, então, numerosos
transportes, entre os quais duas plantas inteiras, com os vasos onde tinham
sido plantadas. Os ramos e os botões foram achados intactos, ainda que uma das
plantas fosse de uma espécie extremamente delicada. Elas foram depositadas nas
mãos de dois experimentadores, um dos quais sentiu, ao mesmo tempo, a dor de
uma queimadura no dedo polegar. Acendeu-se a luz e viu-se que, nesse lugar, se
formara a marca de uma queimadura com uma bolha. (Obra citada, 2ª Monografia –
Caso IV.)
C. Se o Purgatório não existe, por que em alguns
casos citados nesta obra os Espíritos disseram encontrar-se nele?
Os Espíritos comunicantes, reconhecendo haver
pecado e cientes de que mereciam receber de Deus um justo castigo, associavam a
situação em que se encontravam com as dores da expiação da forma como que lhes
fora ensinado na Terra. Bozzano entende que isso efetivamente acontece e a
análise comparada que escreveu no livro A Crise da Morte mostra
que o poder criador do pensamento torna transitoriamente reais e espirituais ou
etericamente objetivas as condições do meio espiritual imaginado. O Sr. Vicenzo
Cavalli, citado pelo Sr. Zingaropoli, manifestara também a mesma ideia, nos
seguintes termos: "Na segunda vida, sabemos que crer é sentir e sentir
equivale a ser, por causa do grande poder da imaginação”. (Obra citada, 2ª
Monografia – Caso IV.)
Observação:
Para acessar a Parte 11 deste estudo,
publicada na semana passada, clique aqui: https://espiritismo-seculoxxi.blogspot.com/2019/12/a-morte-e-osseus-misterios-ernesto_13.html
Como
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Postado
por Astolfo Olegário de Oliveira
Filho às 07:20 Nenhum comentário:
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