terça-feira, 19 de março de 2013

QUEM FOI CHICO XAVIER


 
Marcus de Mario

Saber se Chico Xavier foi tal ou qual personalidade no passado não
 muda  absolutamente nada
 
Temos no movimento espírita alguns livros, e também artigos e entrevistas, veiculados de forma impressa ou digital, cujos autores afirmam ter sido o médium Chico Xavier a reencarnação de grandes vultos da história da humanidade. A maior parte dos autores baseia sua convicção em informações pessoais que teriam sido reveladas pelo próprio médium. É possível? Como mais de um autor confessa, é questão de crença íntima. Não existe prova documental, nem revelações espirituais de várias fontes que confirmem as reencarnações, quase todas de vultos famosos. Não cremos que haja má-fé quanto aos relatos sobre as revelações que teriam sido dadas pelo inesquecível médium, mas conversações íntimas podem ser interpretadas equivocadamente. Entretanto, para nossa reflexão, tomemos as revelações como verdadeiras. Nesse caso, teríamos que admitir que Chico Xavier, anteriormente, foi Platão, João Evangelista, Francisco de Assis e Allan Kardec, entre outros. Sendo assim, passemos essas informações pelo crivo da lógica, da razão e do bom senso, como nos recomenda o Espiritismo.

Os Espíritos Platão e João Evangelista comparecem na codificação espírita. Mas eles seriam Allan Kardec, então quem ditou as mensagens através dos médiuns? A primeira hipótese é a da emancipação da alma, também conhecida como desdobramento, fenômeno anímico em que, no caso, Kardec, assentado à mesa em plena reunião mediúnica, ele mesmo teria dado as comunicações. O fato é possível, pois emancipados podemos acessar com mais facilidade os arquivos do inconsciente, onde estão registradas as memórias de vidas passadas, e, parcialmente desligados do corpo, nos comunicarmos através de um médium. O fenômeno não se discute, temos inúmeros exemplos de sua veracidade, mas, perguntamos, qual a razão disso? Por que os Espíritos Superiores, que ditaram a doutrina, teriam necessidade de provocar esse fenômeno? Não sabemos que a investigação sobre vidas passadas é o que menos importa? E, neste caso, as comunicações teriam o cunho da falsidade? 

Toda revelação deve estar embasada em provas 
Ainda aqui outra observação importante: Kardec, em seus escritos na Revista Espírita e em Obras Póstumas, informa que não tinha faculdade mediúnica ostensiva, sempre servindo-se de médiuns videntes, sonambúlicos, psicógrafos, psicofônicos e de efeitos físicos para obter as informações sobre a realidade espiritual. Nesse caso, como explicar que ele fizesse a emancipação da alma, acessando arquivos conscienciais de vidas pretéritas, o que é um fenômeno raro, e não tivesse conhecimento disso?

Outra explicação é que Espíritos de mesma elevação moral e espiritual teriam se apresentado e assinado as mensagens como se fossem Platão e João Evangelista, respectivamente. Esse fenômeno também não temos necessidade de discutir. Em “O Livro dos Médiuns” isso é estudado e ficamos sabendo que Espíritos de uma mesma ordem podem se substituir, quando necessário. Ora, se as duas personagens estavam reencarnadas como Allan Kardec, qual a necessidade disso? Para dar maior veracidade ao Espiritismo? Mas o próprio codificador afirma que os nomes são de menor importância, aliás ele preferiu ocultar nomes de médiuns e comunicantes, abreviando-os, por exemplo, de Sr. C., médium Srta. M. e assim por diante. Muitas mensagens estão assinadas por Um Espírito Protetor, Um Espírito Amigo e nomes comuns que nada significam para nós.

Um documento é apresentado como prova de que Kardec foi o filósofo grego Platão. Uma anotação do codificador, de próprio punho, de que o Espírito Zéfiro teria igualmente revelado a ele essa encarnação. Lembremos que Zéfiro revelou ao Prof. Denizard Rivail a encarnação como sacerdote druida com o nome Allan Kardec. O documento está guardado em nosso país, sob os cuidados dos herdeiros do estudioso e pesquisador Canuto Abreu, que trouxe farta documentação histórica das terras francesas antes da eclosão da segunda guerra mundial. Ora, toda revelação deve apresentar provas, e isso não existe, foi apenas uma informação trazida por um único Espírito, que Kardec anotou, e nada mais.  

Em vida, Chico Xavier negou ser Kardec reencarnado 
Não se pode dar credibilidade a tudo o que um Espírito diz, ainda mais quando não é um Espírito superior, como era o caso de Zéfiro. Sua revelação sobre o sacerdote druida pode ser pesquisada, gerando o livro “O Gênio Céltico e o Mundo Invisível”, de Léon Denis, uma obra que todos devem conhecer. Agora, como pesquisar e provar que Kardec foi Platão? O fato do codificador ter feito a anotação revela apenas seu espírito de organização e registro das comunicações, e nada mais.

Bem, passemos agora a palavra a Chico Xavier. Em entrevista concedida em 28 de agosto de 1988, ao jornal Diário da Manhã, de Goiânia-Goiás, respondendo à pergunta se seria Kardec reencarnado, ele respondeu: “Não, não sou. (...) digo isto com serenidade. Não sou. Consulto a minha vida psicológica, as minhas tendências. Tudo aquilo que tenho dentro do meu coração sou eu. Não tenho nenhuma semelhança com aquele homem corajoso e forte que, em doze anos, deixou dezoito livros maravilhosos”.

Se suas palavras são produto de sua extrema humildade, temos aqui uma contradição de vulto: humilde e mentiroso? Não podemos conceber tal comportamento em Chico Xavier, que deu provas suficientes de bondade e fidelidade aos princípios espíritas, sendo denominado homem-amor, tal a sua dedicação ao amparo do próximo, e chamado igualmente de ser interexistente, vivendo ao mesmo tempo a realidade material e a realidade espiritual da vida, como dizia J. Herculano Pires.

Do que temos certeza é que Chico Xavier foi um espírito bondoso, fiel observador da doutrina espírita, trabalhador incansável da caridade, médium extraordinário servindo de ponte para o mais além, exemplo de cristão e cidadão. Quanto ao seu passado histórico, as existências que teve em outras encarnações não passam de especulações sem fundamento científico, sem prova, as quais só podemos classificar como crença de foro íntimo e sem respaldo doutrinário.  

É importante saber quem foi Chico Xavier no passado? 
Essas especulações sempre existiram, mas se avultaram após a desencarnação do médium mineiro, que em vida preferiu o silêncio, procurando não alimentar tais ideias, mas, como vimos em sua entrevista aqui reproduzida, negou veementemente ser a reencarnação de Allan Kardec, o que coloca em dúvida, portanto, as demais figuras históricas que teria vivido.

Temos que tomar muito cuidado com a infiltração de ideias estranhas no seio do movimento espírita, ideias essas trazidas por autores encarnados e desencarnados, sem respaldo na lógica, no bom senso e na razão, baseadas apenas numa afirmação e colocando palavras na boca de quem já não mais está aqui para confirmar ou não a veracidade da informação. E o que muda saber se Chico Xavier foi tal ou qual personalidade no passado? Absolutamente nada. E por que teria sempre de ter sido um personagem famoso da história humana? Isso, inclusive, contradiz a informação espírita de que o Espírito necessita passar por diversas experiências até chegar à perfeição, mas, se ele nunca conseguiu ficar no anonimato e realizar tarefas outras, como adquirir essas experiências?

Deixemos nosso querido Chico Xavier dar continuidade ao seu trabalho, agora no mundo espiritual, diminuindo as especulações e tratando com mais seriedade supostas revelações espirituais. Dediquemo-nos a estudar a vasta obra literária produzida pelos Espíritos por seu intermédio, assim crescendo em entendimento e transformando-nos moralmente. Isso é o mais importante. Quem eu fui no passado, quem foi Chico Xavier em existências anteriores, nada disso tem importância, nada modifica no contexto atual, nem diminui ou acrescenta ao que somos e ao que temos de fazer.

Cuidemos de realizar a caridade, de sermos homens e mulheres de bem, de estudar o Espiritismo para melhor vivenciá-lo, combatendo essa tendência de sempre querer endeusar os outros, de santificar aquele que veio apenas para trabalhar e dar testemunho de sua fé a benefício dos homens. Sintonizemos com Jesus Cristo, guia e modelo da humanidade, para sermos cartas vivas do Evangelho, deixando que cada um dê conta de si junto a Deus.

Marcus De Mario é educador, consultor e escritor radicado no Rio de Janeiro-RJ.

Fonte: Retirado de o Consolador, uma Revista Semanal de Divulgação Espírita.

 

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